Pesquisa da UFMT identifica origem e alternativas para o mel com odor fétido em Mato Grosso
30 de abril de 2025 – Atualizado em 30/04/2025 – 2:21pm
Durante o 4º Seminário para o Desenvolvimento Agropecuário de Mato Grosso, realizado no município de Sorriso, a professora doutora Carmen Wobeto, da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT/Campus Sinop), apresentou, na tarde do dia 23 de abril, os resultados de um estudo publicado na revista Ciência Rural sobre o chamado “mel de odor fétido”. A pesquisa investigou as causas, as características sensoriais, a origem botânica e alternativas para valorização desse tipo de mel, que tem gerado preocupações entre apicultores do estado.
Com base na coleta e análise de amostras de méis com odor desagradável de diferentes municípios das regiões norte e médio-norte de Mato Grosso, a pesquisa constatou que todas as amostras apresentavam alta concentração de pólen da espécie Borreria verticillata, conhecida popularmente como “erva-quente”. Em 60% das amostras, esse pólen era predominante, caracterizando méis monoflorais. Trabalhos anteriores já haviam descrito que essa florada está associada a méis de baixa qualidade sensorial, com notas de odor semelhantes a animal, resina, madeira, café, caramelo e fumo.
A equipe utilizou técnicas avançadas de cromatografia para análise dos compostos voláteis e identificou a presença da substância escatol em 8 das 10 amostras analisadas. Essa molécula, associada a odores animais e à degradação proteica, foi apontada como a principal responsável pelo aroma desagradável.
Entretanto, a professora destacou que “não foi possível estabelecer uma relação estatística direta entre a quantidade de pólen de Borreria verticillata e o escatol, indicando que fatores como o metabolismo das abelhas ou a presença de micro-organismos nas colmeias ou na planta podem estar envolvidos na formação do odor”.
Alternativas para aproveitamento do mel
Apesar do odor indesejável ao consumo direto, o estudo revelou que os méis analisados apresentaram elevados teores de compostos fenólicos e flavonoides, o que lhes confere alta capacidade antioxidante e potencial uso medicinal. Esses valores superaram significativamente os encontrados em méis convencionais, indicando novas possibilidades de aproveitamento.
Entre as alternativas sugeridas para uso desse mel estão:
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Inclusão da avaliação do odor no controle de qualidade dos méis regionais;
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Mistura com méis de melhor qualidade para diluir o odor;
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Segmentação para uso em cosméticos e produtos nutracêuticos;
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Emprego em alimentos assados ou cozidos, como na panificação;
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Utilização como alimento de reforço para abelhas em períodos de escassez floral.
A professora também apontou que o manejo da flora pode ser uma estratégia a longo prazo para reduzir a incidência do problema. A introdução de espécies apícolas alternativas que floresçam na mesma época da Borreria verticillata, como pau-formiga, crotalária e mamominha, pode auxiliar no equilíbrio do ecossistema apícola.
Continuidade das pesquisas
A professora Carmen Wobeto reforçou que as pesquisas continuam em andamento, com foco no aprofundamento das causas microbiológicas do odor e na busca por soluções práticas em parceria com outras áreas do conhecimento. “É fundamental integrar especialistas em microbiologia, botânica, palinologia e análise sensorial para traçarmos estratégias eficientes para os apicultores”, ressaltou.
O estudo também reacendeu o debate sobre a certificação orgânica dos produtores da região, como forma de agregar valor e ampliar a competitividade no mercado nacional e internacional. Durante o seminário, foi discutida a proposta de criação de um selo de certificação orgânica consorciada, que poderia reduzir custos e viabilizar a certificação coletiva.
Referências:
SILVA, Bruno Rafael da; D’APOLITO, Carlos; BOTELHO, Sílvia Carvalho Campos; CAVALHEIRO, Larissa; ANDRADE, Ednaldo Antônio de; WOBETO, Carmen. Volatile compounds in off-odor honey. Ciência Rural, v. 51, p. 1–7, 2021.
ALMEIDA-MURADIAN, L. B. et al. Preliminary data on Brazilian monofloral honey from the northeast region using FT-IR ATR spectroscopic, palynological, and color analysis. Química Nova, 37(4):716–719, 2014.
BARTH, O. M. O pólen no mel brasileiro. Rio de Janeiro: Editora Luxor, 1989. 151 p.